terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Morre Mestre da Cultura

Joaquim Mulato, nascido aos três dias do mês de março de 1920, faleceu na tarde de ontem na UTI do Hospital São Vicente de Paulo. Ele foi atropelado por uma motocicleta na tarde da última sexta-feira, dia 20, na estrada Barbalha-Arajara. O violento choque causou-lhe fraturas nas costelas, perfuração no pulmão e forte pancada na cabeça. A convalescência do mestre Joaquim Mulato foi acompanhada por todos os amantes a cultura, que tinham nela, a mais expressiva imagem da simplicidade e de um verdadeiro mestre de cultura popular. Joaquim Mulato de Souza, era solteiro, religioso e defensor da reforma agrária. A prova é que doou lotes de terras para constrição de casas de camponeses na localidades onde sempre morou, mas defendendo que seguissem os preceitos da Igreja Católica, O corpo foi levado ao IML de Juazeiro na tarde de ontem, sob uma forte chuva. Após liberação deve ser velado no plenário da Câmara Municipal, recebendo as honras como Mestre da Cultura e em seguida sepultado no cemitério local. No necrotério do Hospital São vicente, houve a visita do prefeito Zé Leite. A primeira-dama Isabel Cristina, secretário de Cultura, Dorivan Amaro, ex-secretário Sávio Menezes, folclorista Celene Queiroz e amigos da cultura.

Josélio Araújo

César em trio

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César Camargo Mariano: show concretiza antigo desejo de retornar ao formato de trio, lembrando os tempos de Sambalanço e Som Três

Instrumentista virtuoso e arranjador capaz de unir elegância, sensibilidade e inovação, César Camargo Mariano manda subir o piano à serra, tocando este domingo em Guaramiranga, como uma das principais atrações do X Festival Jazz & Blues. Radicado nos EUA, o músico vem na companhia do filho Marcelo Mariano (baixo) e do baterista Jurim Moreira. Ao Caderno 3, por telefone, César falou dos planos para os shows por aqui e dos projetos para celebrar seus 50 anos de carreira

A possibilidade da sua presença em Guaramiranga era comentada já há alguns anos. Que informações você teve sobre o festival?

Estou sabendo desse festival há algum tempo. Sempre fiquei na expectativa, mas por negócio de data, agenda, essas coisas, nunca deu certo. Agora, estou super contente em participar. É ótima essa idéia aí. Tô louco pra ver.

Você está vindo com um show em trio. Por que a opção por esse formato?

Esse trio a gente começou a trabalhar no ano passado, tocando coisas do início da Bossa Nova. Sempre tive essa vontade, depois de tantos anos de carreira, de relembrar isso. Os trios são uma formação clássica da bossa. É um formato que eu acho super interessante, por vários aspectos. Primeiro porque é difícil pra caramba, específico. O quarteto, por exemplo, já é outra coisa. O trio, independente do estilo, do gênero, seja de jazz, música clássica, erudita, ou bossa, samba, é sempre um negócio especial. Existe um destaque igual pros três músicos, todos com funções muito fortes. É uma formação que depende muito de afinidade pessoal e musical muito grande. É um formato muito especial, delicado, em termos de arranjo e de performance.

Fazia tempo que você não se apresentava com essa formação...

Fazia muito tempo. Esse formato de trio, eu sempre fui muito apaixonado. Mas minha carreira toda foi dedicada a composição, arranjo, essas coisas. Mesmo como solista, nos meus 36 discos... No começo era um trio, depois nunca mais. Então posso dizer que tava com saudade, e aí resolvi fazer agora. Já fizemos várias apresentações por aqui, e também em São Paulo, no Rio. Agora vamos poder mostrar por aí.

Em 2009 você chega aos 50 anos de carreira. Algum projeto pra marcar essa data?

Não tô fazendo festa não. É uma coisa mais interna. Mas vou fazer dois projetos de sonho mesmo, coisas que sonhei a vida inteira em fazer. Um é essa retomada do trio. Outro é um trabalho com a Jazz Sinfônica. Os dois estão em andamento, quero registrar isso.

Voltando aos shows, pela formação de trio o repertório aponta basicamente pra Bossa Nova?

Tem algumas coisas bem características da Bossa Nova, mas tem também, por exemplo, Stevie Wonder. ´I can´t help it´, nesse formato de trio, bossa, samba. Tem composições minhas, como ´Samambaia´, que eles pedem... ´Curumim´ pode ser que a gente chegue a tocar, não sei... A gente fez um arranjo. Tem uma música chamada ´Eu só posso assim´, do Pingarrilho e Marcos Vasconcelos. Tem ´O que é amar´, do Johnny Alf. Eu gosto muito do Johnny Alf... Tem ´Olhou pra mim´, do Sílvio César, que eu gravei naquela época com o trio, e agora a gente faz com uma roupagem diferente. ´April child´, do Moacir Santos, ´Bala com bala´, do João Bosco...

Os arranjos partem de você e são trabalhados coletivamente, com essa participação que você ressalta, do formato de trio...

É, nessa coisa especial que é o trio, ocorre isso. O arranjo basicamente, estruturalmente, sai do pianista, mas a contribuição de todos é muito intensa. É um trabalho dos três mesmo. Evidente que levo pronto já, praticamente, mas aí, dependendo do estilo do baterista e do baixista, nos ensaios, tem coisas que vão mudando, acrescentando. Não é um trabalho unilateral.

Curiosamente, o som que se tornou clássico, dos seus arranjos, vem de uma formação posterior aos trios, de arranjos com mais instrumentos, com o piano elétrico. Tendo em vista a força que os trios tinham, você se considera responsável por essa mudança?

O comecinho, o zero mesmo, da minha carreira foi trio. Saí de casa pra ser profissional, com um trio. Tocava em boates e tinha que ser assim. Só de vez em quando a gente colocava uma guitarra, um trompete... E isso aconteceu junto com o começo da Bossa Nova. A influências jazzística era muito grande. Basicamente, na área instrumental, só ouvíamos trios, com algumas exceções. Oscar Peterson, Tommy Flanagn, Bill Evans, até Nat King Cole Trio, George Shearing, a gente só ouvia isso. Então essa influência naturalmente veio. Aliás, fui influenciado pelo jazz antes de começar a tocar. Meu pai, minha mãe, a gente passava o dia ouvindo jazz. A informação era essa, era música clássica e jazz. Então, quando comecei a tocar, fui tocar o que eu ouvia, né, que eram os trios. Aqueles pianistas maravilhosos, aquela mão esquerda maravilhosa... As características daqueles arranjos eram muito especiais. Isso foi uma grande aula, pra mim e pra muitos pianistas. Por isso que surgiram muitos trios naquela época. Foram uma enxurrada! O Zimbo, o Tamba... O Sambalanço Trio e o Som Três, os dois que eu tive... Isso marcou muito o estilo instrumental da bossa nova. Eram trios maravilhosos, coisas especiais. Foi quando os shows começaram a acontecer no Brasil, que não eram tradição, antes da Bossa Nova. Todos os shows daquela época eram com trios, a base era o trio, inclusive com os cantores. O trio foi o alicerce da Bossa Nova, a coisa que mais caracterizou. Ali ficava bem claro o ritmo, a levada, o tipo de harmonia, a batida do samba mesmo, a batida da bossa, até mais que o violão. O violão sozinho foi o que originou a batida da Bossa Nova, com João Gilberto e Milton Banana, mas os trios faziam isso. Como o Som Três, que acabou porque eu já tava num pique muito alto de produção e arranjo. Apareceu a Elis, aí a Elis me pediu pra montar um grupo. Eu não queria montar um trio só, tinha que ser uma coisa maior, por causa da proposta dela, que passou a ser a minha também.

Essa época marcou muito esse som. O timbre do piano elétrico...

O teclado, eu fiquei fascinado com o teclado. Na verdade, mesmo na época dos trios, eu já tocava piano elétrico ou órgão. Com o surgimento da era do sintetizador, aquilo me fascinou muito. Então passei a usar. E me realizou muito. A possibilidade de criar muitos timbres novos, as combinações de som, isso sempre me fascinou. E começou a ficar muito forte esse lado de arranjador e produtor, aí o trio foi ficando pra trás. Raramente eu usava um trio em uma faixa de um disco.

Na época, houve reações a essa mudança?

Houve, mas uma coisa nova sempre espanta. Não os culpo não. Os puristas - uma palavra que eu não gosto, porque eu não sou purista -, mas inclusive amigos meus falaram: ´Pô, bicho, mas você deixou de tocar com os trios pra ficar tocando com máquina!´. Quando comecei a usar computador, então, foi um inferno. Mas sempre encarei isso numa boa, nunca briguei por causa disso, porque entendo a cabeça deles. No ´Elis e Tom´, o Tom Jobim disse pra mim: ´Por que piano elétrico? Por que baixo elétrico?´. Eu era arranjador e produtor do disco, e co-autor da idéia. Eu já sabia o que fazer. O único cara que eu não sabia o que ia fazer era o Tom. Contei pra ele, e ele começou a ficar apavorado. ´Porra, bicho, baixo elétrico, piano elétrico, guitarra...´. Ele ficou assustado, até ouvir. Aí, quando ouviu, ele entendeu tudo, achou maravilhoso. Até falou uma coisa que me marcou pro resto da vida. Meio que se desculpando do que ele tinha falado, ele falou: ´César, eu sou uma pessoa que está acostumada a tomar banho de banheira, com a mesma água no corpo. E você, de chuveiro, sempre com água nova na cabeça´. Quer dizer, o novo espantou ele, naquela hora. Eu compreendo, porque era um projeto grande, de responsabilidade, e éramos todos muito jovens. Esse espanto aconteceu com várias pessoas. Mas eu gosto disso.

Fonte: Diário Do Nordeste
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